"Com uma tal falta de literatura, como há hoje, que pode um homem génio fazer se não converter-se, ele só, em uma literatura? Com uma tal falta de gente coexistível, como há hoje, que pode um homem de sensibilidade fazer se não inventar os seus amigos, ou, quanto menos, os seus companheiros de espírito?" - Fernando António Nogueira Pessoa
01/03/2010
“The man who sold the world”
Conheci um homem que vendeu o mundo…
Já não o queria para nada.
“Já não tem valor!” – dizia.
Vendi-o a um idiota qualquer.
Um daqueles que ainda tem esperanças...”
Ele costumava dizer-me
Que o mundo já nada nos pode dar...
Era um homem solitário esse…
Um dos poucos verdadeiros que existiu.
Eu tive a sorte de ainda o conhecer!
Já o conheci velho.
Ele contava-me histórias;
Histórias de quando era criança.
“Sabes, um dia também eu fui criança!
Tinha as minhas ilusões e os meus sonhos;
As minhas aventuras nos mares da ilusão…
Mas dia por dia brincava cada vez mais sozinho,
Cada vez mais me percebiam menos.
Chegaram a chamar-me louco!”
(E fazia aquele ar esbugalhado de indignação…)
“Loucos eram eles! Dizia-lhes eu…
Loucos por acreditarem no amor,
Por acreditarem no mundo!
Por acharem que ele ainda tinha solução.
O mundo nunca teve solução!”
Dito isto, fazia sempre uma pausa
E pensava… pensava na sua infância.
Na velhice, na importância mínima do tempo…
“Sabes, eu como nunca acreditei no mundo;
Desisti e criei o meu próprio…
Revesti-me de máscaras
E comecei a viver nos dois mundos!
Era assim ao início…
Mas depois comecei a sofrer.
Refugiei-me mais no meu mundo
E deixei o real de parte.
Sabes… O mundo real só nos trás sofrimento!”
Dele guardo a sabedoria;
A sabedoria de alguém muito velho…
Mais velho que mundo, diria eu!
Morreu velho e só…
Morreu sem nunca ninguém saber.
Conheci-o já muito velho;
E no entanto tão jovem…
Deixou-se morrer nele próprio;
Simplesmente desistiu de viver….
Não suportava a ideia de viver num mundo cheio de nada.
Mas no entanto afogou-se no seu próprio mundo!
Por ter espaço a mais…
Eu mesmo lhe cavei a sepultura;
Enterrei-o com as minhas próprias mãos.
Deixei-lhe uma única flor na campa…
Comecei eu a viver por ele,
Mantive secretamente o seu corpo vivo.
E nunca o mundo se apercebeu…
O meu nome é Blackbird…
O velho chamava-se Tiago;
E já tinha vivido demasiado…
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário